por P. Gonçalo Portocarrera de Almada, 2024

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1. Definição. A palavra leigo tem origem grega: procede do termo ‘laos’, que significa povo. Neste sentido, o leigo é aquele que pertence ao povo de Deus, ou seja, o fiel cristão. Também se chama leigo ao que não recebeu nenhum grau do Sacramento da Ordem. Neste segundo sentido, tanto são leigos os fiéis que vivem no meio do mundo, geralmente em família e realizando algum trabalho profissional, como os religiosos que não receberam ordens sagradas, os irmãos leigos. Numa terceira acepção, são leigos, propriamente ditos, os fiéis católicos não ordenados nem membros de nenhuma ordem religiosa ou instituição similar.

2. Leigos e laicos, laicado e laicismo. Na língua portuguesa distinguem-se dois termos que, embora com a mesma origem etimológica, têm, no entanto, diferentes significados. Se leigo é, como se disse, o fiel cristão que não recebeu nenhum grau do Sacramento da Ordem, nem é religioso, o laico é, pelo contrário, o cidadão que não professa nenhuma religião e defende a total separação entre a Igreja e o Estado. Esta distinção entre leigos e laicos tem correspondência nos substantivos colectivos ‘laicado’, o conjunto dos leigos que são fiéis da Igreja; e ‘laicismo’, a ideologia que defende a total separação entre o Estado e as religiões.

3. As ordens espiritual e temporal. Nas primitivas organizações políticas, o titular do poder temporal era também titular do poder sagrado. Os imperadores romanos eram também máximos pontífices e podiam ser divinizados. Em Israel, o povo eleito, embora por vezes se distinguisse o sacerdote, ou profeta, do rei, também o monarca era escolhido por Deus – assim aconteceu com Saúl e David – e, como tal, ungido. Devia governar tendo em conta a protecção divina: David, por ter feito um recenseamento do seu povo, atitude que expressava desconfiança em relação a Deus, incorreu em falta.

4. O messianismo judaico. No princípio desta era, Israel vivia na expectativa do Messias. A sua vinda era muito necessária, pois o povo eleito, ao ser convertido numa mera província do império romano, tinha perdido a sua independência e liberdade. Embora conservassem algumas das suas instituições civis e religiosas, tinham que se submeter à autoridade romana militar e pagar impostos. O Messias era desejado, como sendo o chefe político e militar que, supostamente, iria libertar Israel do humilhante jugo estrangeiro.

5. Cristo e o reino de Israel. Embora em Cristo se tenham cumprido as profecias messiânicas – nasceu da linhagem do Rei David, em Belém, de uma mãe virgem, etc. – não correspondeu à expectativa política de alguns dos judeus do seu tempo. Várias vezes as multidões o quiseram proclamar rei, mas nunca aceitou essa investidura popular, nem sequer na sua entrada triunfal em Jerusalém, por ocasião da Páscoa, nas vésperas da sua paixão e morte. Também os seus apóstolos partilhavam essa ambição política: dois deles pedirem a Jesus lugares importantes no seu reino, e vários esperavam que restaurasse o Reino de Israel.

6. Jesus Cristo foi falsamente acusado pelos fariseus de se intitular rei dos Judeus, título que foi o da sua condenação à morte. Diante de Pilatos, Jesus afirma que é rei, mas o seu reino não é deste mundo. Quando, em relação ao tributo, afirmou “dai a César o que é de César, e a Deus que é de Deus” (Mt 22,21), não disse que o que é temporal não depende de Deus, pois ele próprio disse a Pilatos que não teria nenhum poder se o mesmo não lhe tivesse sido dado do alto (Jo 19,11), mas que há uma relativa autonomia do que é temporal, embora tudo dependa, em última instância, do Criador.

7. Laicismo e relações entre a Igreja e o Estado. Enquanto o laicismo propugna uma separação absoluta da Igreja e do Estado, a Doutrina Social da Igreja advoga uma relação de respeito mútuo e de colaboração, até porque se o Estado pode ser laico, a sociedade o não é, pois todos os homens são naturalmente religiosos, e o bem comum dos cidadãos inclui também o seu bem espiritual. O laicismo está conotado com ideologias anticlericais, como o liberalismo radical e todos os totalitarismos, por razão da sua pretensão totalitária e incompreensão da liberdade religiosa.

Bibliografia:

  • Catecismo da Igreja Católica, Gráfica de Coimbra, 1993.
  • Código de Direito Canónico, 2ª edição revista, Ed. Theologica, Braga 1997.
  • Vaticano II, Documentos Conciliares, União Gráfica, 1966.
  • Dominique Le Tourneau, Les mots du christianisme, Fayard, Paris 2005.
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