por Inês Neves, 2024

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1. Numa aceção lata, poderá traduzir e abarcar as diferentes experiências de integração no continente europeu. É, porém, aqui mobilizada para caracterizar o processo único, gradual-evolutivo, histórico- político, da dinâmica de institucionalização regional na origem da União Europeia – uma entidade política sui generis e uma comunidade de direito não diretamente recondutível aos postulados prototípicos da intergovernamentalidade ou da estatalidade.

2. Na originalidade da integração europeia está a simbiose. Por um lado, é, ainda, cooperação estreita entre Estados-Membros, visível, desde logo, nas instituições intergovernamentais – o Conselho Europeu e o Conselho da União Europeia -, e no poder que, pese embora se procure impor como primário, é inarredavelmente derivado e limitado pela voluntas e pela atribuição, acompanhadas da subsidiariedade. Por outro lado, visa a prossecução comum de objetivos, não já económicos (apenas), mas também políticos, jurídicos e sociais, irrompendo e impregnando os ordenamentos político-jurídicos, atuados por instituições supranacionais independentes (a Comissão Europeia, o Parlamento Europeu e o Tribunal de Justiça da União Europeia ‘TJUE’, sem esquecer os órgãos, os organismos e as agências, e as novas species).

3. Na origem do projeto europeu está a 2.ª Guerra Mundial, o seu pós, e a busca pela paz, requisito kantiano de prosperidade económica ou, quiçá, consequência desta, se recordada a lógica de Montesquieu de uma cooperação-interdependência económica como pré-condição de paz (prosperidade e estabilidade).

4. O aprofundamento e os alargamentos que acompanham a integração europeia e a sucessão dos Tratados, – a saber, o Tratado que institui a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (1951); os Tratados de Roma (1957); o Tratado de Bruxelas (1965); o Ato Único Europeu (1986); o Tratado de Maastricht (1992); o Tratado de Amesterdão (1997); o Tratado de Nice (2001) e o Tratado de Lisboa (2007) -, concretizam-se nos planos i) horizontal, com o alargamento dos objetivos, das competências e das políticas, e ii) vertical, com a delegação de autoridade (ou soberania) pelos Estados-Membros e a consequente supranacionalização das instituições europeias.

5. Não se verifica, porém, um qualquer incrementalismo acético, em estado puro, unidirecional ou irreversível. Pelo contrário, há recuos, diferenciação e desintegração, além de crises sucessivas: da euroesclerose da cadeira vazia à crise da dívida soberana, seguida de uma pandemia e de uma guerra, sempre acompanhadas pelos estruturais, como o euroceticismo.

6. A questão da participação de Portugal na integração europeia é anterior ao pedido de adesão (em 1977), e à respetiva formalização (em 1986). O Atlanticismo, o ceticismo da diluição da soberania nacional, e as condicionantes de um país pequeno, periférico, de trajetória histórica e regime político desalinhados com o projeto europeu, viriam a soçobrar perante as promessas da democracia liberal, da prosperidade económica e da modernização da sociedade, somadas ao risco da marginalização na sombra dos grandes espaços da cena internacional. A relação com o projeto europeu é, também ela, evolutiva. Começa com a reabilitação – com a construção dos pilares de uma economia de mercado -, continuando, depois, com a afirmação do bom aluno, capaz de capitalizar as relações privilegiadas com os países de língua portuguesa, e jogar, assim, a cartada lusófona, qual contrapeso da sua dependência em potência.

7. São várias as teorias explicativas (do futuro) da União, como objeto político não identificado, como entidade política sui generis ou além do Estado, como federação soft, ou, e em todo o caso, como realidade político-jurídica contestada. Desde o neofuncionalismo, pai do spillover de Schuman e de Monnet, ao intergovernamentalismo liberal, sem esquecer o federalismo dos Estados Unidos da Europa, todas logram explicar o que são apenas dimensões do fenómeno, condenadas à interdependência na busca pela completude.

8. A aceitação da União pelos Estados e pelos cidadãos (também eles sujeitos da nova comunidade de direito) não depende nem pressupõe a estadualidade. É, antes, dependência da perspetivação como Politeia. E se a atuação pretoriana do TJUE é jurísgena de uma nova ordem, assente no primado, no efeito direto e na aplicabilidade direta, não deixará aquela de ser temperada pela subsidiariedade, pela proporcionalidade e pela identidade constitucional. Não já, certamente, como contra-poderes em choque, mas, e antes, como motores de um processo de retroalimentação recíproca, de downloading e de uploading, na origem da confluência e da identidade, quais respostas necessárias à policrise.

Bibliografia:

  • Graça Enes Ferreira,Unidade e Diferenciação no Direito da União Europeia – A diferenciação como um princípio estruturante do sistema jurídico da União, Coimbra: Almedina, 2017
  • Laura Ferreira-Pereira, “Portugal in the European Union: Chronicling a Transformative Journey” in Fernandes, Jorge et al. (eds.) The Oxford Handbook of Portuguese Politics, Oxford, 2022
  • Vital Moreira,“Respublica” Europeia – Estudos de Direito Constitucional da União Europeia, Coimbra: Coimbra Editora, 2014
  • Aurelien Portuese, “European Integration” in Marciano, Alain/Ramello, Giovanni Battista (eds.)Encyclopedia of Law and Economics, Nova Iorque: Springer, 2021
  • Jo Shaw, “European Integration” in Garben, Sacha/Gormley, Laurence (eds.)The Oxford Encylopedia of EU Law [OEEUL], Oxford, 2022
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