por Paulo Otero, 2024

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1. O moderno socialismo, expressando uma conceção política de origem franco-britânica, surgida nos anos de 1830 a 1840, por via de Saint-Simon e de Robert Owen, é uma decorrência da Revolução Francesa, visando edificar uma sociedade igualitária e mais justa, por reação ao individualismo e às situações de miséria social do liberalismo, sem prejuízo de as suas raízes mais remotas se encontrarem na Antiguidade Clássica (v.g., A República de Platão) e na Idade Moderna (v.g., A Utopia de Tomás More, A Cidade do Sol de Tomás Campanella ou os Diggers liderados por Gerrard Winstanley).

2. O socialismo envolve três preferências estruturais: (i) prefere a intervenção do Estado no plano económico, social e cultural, em vez de uma postura de abstenção, assente na valorização do indivíduo, da sociedade civil e do mercado; (ii) em caso de conflito entre a igualdade e a liberdade, confere primado à primeira, subordinando os direitos individuais a razões decorrentes da garantia de direitos e de interesses da coletividade; (iii) sobreposição da propriedade coletiva à propriedade privada, fazendo da dinamização daquela, por via de confisco, da nacionalização ou de uma tributação intolerável, um propósito político, dentro de um sistema económico de direção central ou de um sistema de mercado sujeito a forte intervenção pública.

3. O socialismo conheceu, ao longo dos séculos XIX a XXI, diferentes modelos, desde logo na sua relação com o Estado e a economia, podendo dizer-se que existem quatro grandes famílias socialistas: (i) a família socialista que aceita o pluralismo ideológico e o capitalismo, convivendo com um sistema económico de mercado com preocupações sociais, falando-se em “socialismo democrático”, o qual permite recortar uma orientação económica mais coletivizadora ou, em sentido diferente, mais neoliberal, acompanhada de uma política de subsídios a grupos sociais mais vulneráveis, promovendo a sua dependência financeira do Estado e, por essa via, a respetiva captura política e inerente fidelização eleitoral; (ii) a família socialista que, negando o pluralismo político e uma economia de mercado, pretende uma rotura com a tradição liberal da liberdade e da propriedade, defendendo a ditadura do proletariado e a edificação de uma sociedade sem classes, num propósito último de abolição do Estado, visível no “socialismo marxista-leninista”; (iii) a família socialista que, negando o pluralismo político, permite o funcionamento de uma economia de direção central totalmente imersa numa prática capitalista, tal como sucede com a República Popular da China, podendo falar-se em “socialismo chinês”: (iv) a família socialista que, tripudiando e descaraterizando o pluralismo e a economia de mercado existentes, tolera as instituições democráticas, subvertendo-as e servindo-se delas para chegar ao poder e depois se perpetuar, numa difícil convivência com a oposição política, tal com sucede com o “socialismo populista” da Venezuela de Chávez e de Maduro ou, previsivelmente, com os partidos políticos de extrema-esquerda existentes nas democracias ocidentais, se assumissem responsabilidades governativas exclusivas.

Bibliografia:

  • EICHLER, Willi, Zur Einführung in den demokratischen Sozialismus, Bonn, 1973
  • NEMO, Philippe, Histoire des Idées Politiques aux Temps Modernes et Contemporains, Paris, 2009, pp. 779 ss.
  • PRÉLOT, Marcel; LESCUYER, Georges, Histoire des Idées Politiques, 12ª ed., Paris, 1994, pp. 458 ss.
  • SOTELO, Ignacio, “Socialismo”, in MELLÓN, Joan Antón (ed.), Ideologías y Movimentos Políticos Contemporáneos, 2ª ed, reimp., Madrid, 2008, pp. 79 ss.
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