por Inês Neves, 2024

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1. Modelo, programa e princípio de ordem e de organização económica(s), assente na autorresponsabilidade do empresário e na(s) liberdade(s) económica(s) dos agentes económicos (privados). Caracteriza-o a adesão aos princípios da concorrência e da alocação descentralizada, encontrando no mercado a respetiva garantia institucional.

2. O mercado é, além de fórum-lugar de coordenação social e de trocas voluntárias, garantia do alinhamento dos planos e das motivações individuais dos, pelos e entre os agentes económicos, funcionando, também, como mecanismo de formação (livre) dos preços.

3. Uma economia de mercado surge legitimada, em primeira linha, pelos seus pressupostos apriorísticos e pelas respetivas condições de funcionamento: o respeito e a garantia de direitos e liberdades fundamentais, entre os quais o livre desenvolvimento da personalidade, as liberdades de consumo e de investimento, a autonomia privada, a liberdade de profissão, o direito de propriedade e a liberdade de iniciativa económica privada. A posteriori, é justificada, também, pelas suas promessas em termos de paz, autonomia, eficiência, crescimento, inovação e bem-estar. Pela sua natureza, pelos seus objetivos, e pela sua especialidade, os agentes económicos privados e o mercado encontram-se mais bem posicionados para prover grande parte daqueles fins.

4. Caracterizam uma economia de mercado, numa aceção pura ou como modelo perfeito, os princípios da individualidade, da subsidiariedade e da mão invisível, a que acrescem postulados básicos, como igualdade de acesso; informação perfeita; racionalidade das escolhas económicas; capacidade de internalização das externalidades; correção das falhas por tentativa-erro; alinhamento dos interesses egoísticos da decisão económica com a necessidade geral; inexistência de produtos e serviços não comercializáveis, e compensação de eventuais distorções da concorrência no mercado através da concorrência pelo mercado (v.g. disputabilidade). Opõe-se ao(s) modelo(s) de economia centralizada, planificada ou de direção central, caracterizado(s) pelo controlo da produção e da economia pelo Estado, e incompatíveis com o Estado de Direito como Estado de direitos fundamentais.

5. Pese embora potencialmente redutível a uma significância em estado puro, deve, e só poderá hoje ser lida, como economia social de mercado (fórmula originária do enquadramento institucional económico alemão do pós 2.ª Guerra, entretanto beneficiária das colorações dos diferentes contextos socioculturais em que experimentada). Se é, para uns, alternativa liberal à economia planificada, surge, para outros, como alternativa social à economia de mercado pura. É, em todo o caso, mais do que um modelo alternativo, uma leitura necessária da economia de mercado, na ausência da verificação efetiva de todos os postulados dos quais depende.

6. Numa economia (social) de mercado, os ideais do mercado livre e das liberdades (económicas) não perdem primazia nem primado. Surgem, pelo contrário, pontuados por exigências de justiça social, dignidade e segurança. É assim que, sem substituir o mercado e os agentes económicos privados (porventura, a pior solução à exceção de todas as outras), se assiste à orientação-regulação do poder económico pelo poder político, assegurando a internalização de valores societais básicos por quadros regulatórios que, sem arbitrariamente procurar domar o indomável (tentativa sempre fiscalizável pelos direitos fundamentais como escudos e trunfos), visam, antes, i) a prossecução de objetivos macroeconómicos (também eles pré-condições do mercado), ii) a correção de falhas de mercado (de que são exemplo os monopólios naturais, as distorções da concorrência e o fornecimento deficitário de bens públicos) e iii) a devida consideração de externalidades.

7. A rede de relações necessárias para o bom funcionamento de uma economia de mercado sempre dependeu (ainda que em diferentes graus) de dimensões públicas e privadas. Não obstante, se é certo não ser o Estado – não hoje, pelo menos – mero garante abstencionista e formal dos direitos e promotor agnóstico do mercado, é-lhe, em economia de mercado, vedada a assunção arbitrária das vestes de gestor ou de empresário, colonializando um espaço que é, por destinação natural, dos privados, e que com estes deverá permanecer, enquanto produto do exercício da respetiva liberdade-autonomia.

Bibliografia:

  • Capitalism and Freedom, Chicago: University of Chicago Press, 1962
  • Rolf H. Hasse, Schneider, Hermann & Weigelt, Klaus (eds.), Social Market Economy: History, Principles and Implementation – From A to Z, Ferdinand Schöningh, Paderborn, Germany Konrad-Adenauer-Stiftung, 2008
  • Lisa Herzog, Inventing the Market. Smith, Hegel, and Political Theory, Oxford: Oxford University Press, 2013
  • Michael J. Sandel,What Money Can’t Buy: The Moral Limits of Markets, Nova Iorque: Farrar Straus Giroux, 2012
  • Joseph Schumpeter, Capitalism, Socialism and Democracy, Nova Iorque: Harper & Brothers, 1942
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