por Pedro Gil, 2024

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A comunicação é o processo prolongado no tempo que leva a projetar a realidade daquilo que somos ou pensamos numa imagem fiel que os outros partilham. A comunicação é boa ou não boa em função do grau de sintonia entre realidade e imagem percecionada.

A comunicação dá-se no ilimitado mundo das relações interpessoais, e dá-se também no universo das organizações onde é muitas vezes designada comunicação institucional ou das organizações. Apesar da evidente diferença entre a comunicação interpessoal e a comunicação institucional própria das organizações, muitos princípios de comunicação são válidos para ambas. Mais: é cada vez maior a convicção de que aquilo que é qualidade comunicativa nas organizações vem de ser, antes, qualidade comunicativa nas pessoas e suas relações.

Por isso, cada vez se supera mais a estendida e difusa intuição de que a comunicação seja uma coleção imprecisa de ações e recursos, que têm a ver com conseguir “boas notícias”,  sair-se bem em entrevistas, apagar polémicas, aprimorar a imagem, “tornar bonitas” as mensagens, e que por isso se pode confiar a um departamento opcional apêndice da organização, para cada vez se passar a olhar com muito mais realismo para a comunicação como o departamento que dá expressão concreta à preocupação da chefia da organização por aspetos nucleares, e nada cosméticos, de que depende a sua saúde – e com o tempo – a sua sobrevivência.

Assim, a comunicação gera uma cultura que a pouco e pouco incorpora elementos como os seguintes. As palavras têm o sentido, não que eu lhes dou, mas que lhes dá quem as ouve. Toda a comunicação recebida merece resposta. Se quero saber alguma coisa, pergunto; se quero que alguma coisa se saiba, digo. Se quero que alguma coisa se saiba, repetirei mil vezes amavelmente como na primeira vez. É normal receber sobretudo queixas; o elogio é muito mais lento que a crítica. Se há queixas pouco educadas, é normal; a queixa cala na fase da tolerância e explode ao chegar à fase da irritação. Quase sempre as queixas têm alguma razão, e obrigam sempre – sem quase – a pensar. É bom esperar sempre nas pessoas, e não cortar relações. É inútil e falível tentar adivinhar intenções; só é firme a terra dos factos. Informar os outros é homenageá-los; informar subalternos é elevá-los. Quanto mais informação dou; mais lealdade recebo. Os “nossos” têm de ser informados sempre por nós, e não por outros. Em especial, quando tenho uma má notícia, seja eu a dar, e não outros. Devo perguntar-me muitas vezes: sou consciente dos problemas e projetos “dos de baixo”?; quero um teste infalível para saber?: é perguntar-lhes. Para conhecer bem as pessoas devemos dedicar 80% a ouvir e apenas 20% a falar. Quando decidimos ter simpatia por alguém, então podemos compreendê-la. O respeito ao falar de ausentes deve ser ainda maior que o respeito ao falar dos presentes. Não posso exigir que os outros confiem em mim: a confiança conquista-se com as minhas ações. Não faça eu nada que não possa explicar, que não pareça razoável, que choque ou que desalente.

A comunicação das organizações, o tal processo que projeta a identidade numa imagem fiel partilhada, pode pois também ser definida como “ter relações pessoais de qualidade”.

Bibliografia

  • Yago De la Cierva, Leading companies through storms and crisis: Principles and best practices in prevention, crisis management and communication, Ediciones Universidad De Navarra, S.A.
  • Brad Phillips, The Media Training Bible : 101 Things You Absolutely, Positively Need To Know Before Your Next Interview, Barnes & Nobles.
  • António Granado e José Vítor Malheiros, Como Falar com Jornalistas sem Ficar à Beira de um Ataque de Nervos – Guia para investigadores e profissionais de comunicação, Gradiva
  • Juan Pablo Cannata, Los valores en el discurso público : comunicar la propia fe en la cultura del siglo XXI, LOGOS
  • Austen Ivereigh, Como defender a fé sem levantar a voz – Respostas civilizadas a perguntas desafiantes, Paulinas
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